quarta-feira, 30 de junho de 2021

A edição como mero pretexto


Sabem quando nos iludimos e pensamos que aquela pessoa está a acenar para nós? Foi assim com este Censor. Anos 80, cassetes VHS, salas de montagem, filmes no filme, isto só pode ser para mim. Certo? Errado, passa por cima, ou ao lado. Ao engolir a estética da sua protagonista – a ascendente Niamh Algar – a obra de Prano Bailey-Bond acaba por nunca escolher verdadeiramente nenhum dos seus dois caminhos: o mistério à volta da irmã e a sua própria paranoia. Ficamos à porta, sem entusiasmo e, aparentemente, sem idade para mergulhar na carne censurada. 

segunda-feira, 28 de junho de 2021

Deixam o documento aberto depois dá nisto


O que parece, é que a determinada altura, o argumentista foi buscar almoço e deixou o documento aberto, às mãos de um colega maldoso. Na brincadeira, fodeu-lhe o final. Existem dois filmes em The Woman in the Window: um thriller claustrofóbico, com uma cinematografia dedilhada (de babar) e uma protagonista em máxima força, a colocar a dúvida, a ilusão e a doença em cada sentença. Depois, por falta de coragem ou de autonomia, perde-se todo o valor da trama, as personagens são encostadas a um canto e partimos para a mais banal e televisiva das resoluções. Uma obra tão bem pintada, com um ritmo tão acertado, merecia bem melhor.

sábado, 26 de junho de 2021

Até ao fim

Daquelas histórias que, enquanto não dá um belo filme, toma-nos de assalto com um belo documentário. I´ll Be Gone in the Dark (HBO) secundariza a questão do mistério, acentuando antes os efeitos que os crimes tiveram nas suas vítimas e na jornalista que os investigou. Aliás, é ela, Michelle McNamara, sua obsessão - e aqui pensamos de imediato no Zodiac de Fincher - que dão voz aos traumas, às injustiças, ao recomeçar. A sua história (e total imersão) a ramificar para tantas outras, num legado que felizmente teve um final feliz. A série, de seis episódios lançados em 2020, foi complementada com um episódio novo a semana passada. Obrigatório. 

sexta-feira, 25 de junho de 2021

Gigante

A nova temporada de Love,Death & Robots é uma proposta menor, em número e em qualidade, que a sua predecessora. Porém, a curta de encerramento The Drowned Giant, inspirada numa short story de J.G. Ballard, é daqueles feitos cinemáticos tão completo, tão certeiro, que nos deixa indefinidamente conquistados, a ver o mar. 

quarta-feira, 23 de junho de 2021

Nas suas Cinque Terre


Nem estava particularmente empolgado, quase arrastado porque pronto, são férias em família e porque pronto, é a Pixar. Mas à medida que se vai saindo da água, há um coração a ocupar todos os espaços. A crescer sem medos nem Brunos. Um amor de verão que se quer lá, naqueles instantes de final de dia. E se há algo de menino na corrida, existe depois algo de profundamente adulto na passagem [SPOILERS] Quando Luca pergunta ao seu amigo como vai no futuro saber se ele está bem, Alberto responde - Tu tiraste-me da ilha Luca, eu estou bem. Depois a chuva, que coisa mais bonita amigos, que coisa mais bonita.

terça-feira, 22 de junho de 2021

É é, este vai ser bom

Se havia alguma necessidade de fazer uma sequela, estilo Hunger Games, do filme de 2019? Claro que não. Se vou ver? Claro que sim. Como dizia a minha tia: seja mitologia boa ou ruim, é para ser levada até ao fim.

segunda-feira, 21 de junho de 2021

Mas afinal o que é que não viste do Gus Van Sant? - To Die For (1995)

 
Começa hoje o Ciclo " Mas afinal o que é que não viste do Gus Van Sant?", que pretende, desconstruindo um pouco o seu complexo título, levar-nos aquelas obras do mestre que eu ainda não vi. Começando por um daqueles empurrar com a barriga dos anos 90, quando os cartazes apareciam nos jornais, a preto e branco, para serem recortados e guardados em dossiers. Fui deixando passar e depois desapareceu, com o vento. Até hoje. E é engraçado contrastar a ideia que temos do filme - com tudo o que fomos lendo, vendo - e depois a obra propriamente dita. Como a voz de uma pessoa que nunca vimos. Neste caso alguém totalmente distinto. O que fazia como um thriller erótico de ascensão mediática acaba por ser uma inventiva sátira local baseada num caso verídico (agora já sei quem inspirou o I Tonya). Uma comédia negra salpicada de entrevistas, a cair para o falso documentário, a aproveitar-se duplamente das suas personagens e a apontar a câmara inúmeras vezes para nós. Para além de uma Nicole Kidman de corpo inteiro - aqueles monólogos com a câmara são arrepiantes - uma das coisas que mais gostei, e que levo, é a clara fotografia de uma comunidade, de uma galáxia fechada, que impede saída até à mais inteligente/cruel/tresloucada das estrelas. 

sexta-feira, 18 de junho de 2021

Sr. Alguém


Ainda no outro dia falei deste moço a propósito da cena de abertura de American Assassin. Gosto dele, segurinho, com aquela genica aventureira. Para além disso calcorreia géneros que me são queridos, desde os labirintos até aos monstros. E enquanto não ganho tomates para ver aquele Infinite do Fuqua, recuei neste Flashback. Lá, conhecemos Fred, um jovem (aparentemente) realizado a assinalar os clássicos "casar", "ter uma casa" e "um bom emprego". Vai na volta, o sacana começa a ter umas visões do seu tempo de secundário, em concreto duma rapariga que desapareceu e duma noite em que tomaram todos uma droga chamada Mercury. Começa então a procura pela verdade, neste mergulho na toca de um coelho Donnie Darkiano com muitos vislumbres de Mr. Nobody. As escolhas, o livre arbítrio, os ramos que se bifurcam em diferentes frutos. Tudo isso.  Este tipo de filmes não lineares, que se montam como enigmas, facilmente se descontrolam e caem no loop das suas próprias engrenagens. Acontece isso aqui: a alucinação e sua imagética, as idas e voltas, são desafiantes até ao momento em que se tornam apenas mais do mesmo, sem uma mão que nos puxe da areia e nos dê vida para além do final.

quarta-feira, 16 de junho de 2021

Purgar como se não houvesse amanhã

 
Oh diabo, Purga Rei do Gado? A verdade é que a azia está altinha depois daquela prequela desinspirada e duma série manhosa de onde não consegui passar do episódio piloto. Mas já podíamos ir todos dormir não é, ninguém levava a mal. A trilogia principal existe, fomos felizes nela, especialmente com os capítulos Frank Grillo, passo a passo explorando os cenários certos, no tempo certo. O antes, o depois, se calhar é esticar demais rumo a uma Purga onde? Vá lá, vocês sabem, começa por Es e acaba em paço. 

terça-feira, 15 de junho de 2021

Arranques a matar

Hotel Mumbai é um belíssimo thriller, de uma secura segura, prática e imediata. Porém continua por igualar o que Cuesta fez na cena de abertura do seu American Assassin. Mergulho total. [Atenção aos mais sensíveis]

segunda-feira, 14 de junho de 2021

Suores Frios – A barata diz que tem (Pesadelo em Elm Street 4)


"Curiosidade. É a curiosidade que melhor descreve e ensopa o meu cinema de cachopo. A magia do proibido sempre me inquietou. Tinha de saber, alguém tinha de me contar. E se por um lado os meus pais eram incansáveis timoneiros neste meu deslumbre, por outro tinham regras e linhas muito bem definidas. Um filme para maiores de 16, era um filme para maiores de 16. Mostra lá o BI. Pois. Nada feito. Foi assim que no alto dos meus dez anos sabia tudo o que tinha acontecido em “O Silêncio dos Inocentes”. De trás para a frente, porque tinha ouvido a história, feito perguntas, uma e outra vez. Tive um filme, ali naquela narração paternal cheia de emoção, terror, energia, que só materializei anos mais tarde. Eram obras imaginadas, em constante crescimento, aguardando o dia em que, juntamente com outras borbulhas, passariam a ser uma realidade. Porém, estes embargos cinéfilos, eram por vezes contornados: em casa de compinchas as leis eram outras, as cassetes também. Um dos meus grandes amigos era doidinho por terror e não tinha as minhas restrições em relação à faixa etária: predador, omen, mosca um, mosca dois, ia tudo a eito. E foi numa dessas tardes, no início dos anos 90, que em casa dele passava o “Pesadelo em Elm Street 4”."

Leiam o resto deste pesadelo no blogue Not a film critic, no âmbito da fantástica reunião/rubrica que a Rita criou, Suores Frios, onde cada convidado fala de uma cena de terror que o tenha marcado e deixado até hoje com aquele vincado arrepio na espinha. 

sábado, 12 de junho de 2021

Esqueci-me do que ia escrever neste título

 
Epá eu até aquela prequela manhosa do Game of Thrones estou a pensar ver. Aquela dos mocitos loiros, avós da Sarah Connor dos 300. Tudo porque tem a Olivia Cooke, uma das minhas mais que tudo no cineverso. E este Little Fish, coloca-a lado a lado com outro ator que gosto muito, Jack O´Connel, num desesperado contrarrelógio. Uma pandemia mundial devora aos poucos as nossas memórias e enquanto a sociedade colapsa, um casal tenta salvar-se. Chad Hartigan oferece um olhar muito fechado, muito delicado sobre aquilo que nos forma enquanto pares e as ameaças que enfrentamos enquanto companheiros; com a erosão do tempo, as perceções, as medidas, as cores que se mutam e que criam diferentes frames. Há um tom tão inevitável mas simultaneamente tão otimista - a remeter para outros despertares - que nos esquecemos rapidamente porque é que estávamos sisudos. 

John Powell (1)

terça-feira, 8 de junho de 2021

Peixinho da horta

Ui ui ui. Ui, ui, ui. Eu a pensar que o Saw 3D não tinha adversários na zona de despromoção. Afinal: olá Miguel, tens cinco minutos para encontrar uma coisa boa neste Spiral: From the Book of Saw, ou então, esta caixa VHS gigante onde estás preso irá encher-se de farinha de milho, sal, alho em pó, pimenta moída e vinte ovos batidos, e abrir-se-á de seguida para uma frigideira gigante de azeite a ferver. Já fui. Estou a brincar, a ideia é bem intencionada, na sua ingenuidade e admiração de fã, e tem aquele toque suado, quente. Não são só os filtros, vemos mesmo a malta a transpirar, a penar. De resto, infelizmente - e eu estava entusiasmado! - este filme não cumpre os mínimos. Um Chris Rock completamente fora de tom, à procura de uma personagem que não é sua, semicerrando os olhos, gritando, ali à beira do sketch, apoiado numa série de canastrões, maus diálogos e armadilhas sem construção nenhuma. A saga Saw, teve os seus altos e baixos, mas uma coisa que sempre tentou manter foi a estrutura do puzzle, não só a grande fotografia, onde todos os filmes têm lugar e encaixam uns nos outros, mas também individualmente, onde cada novo drama era uma nova charada, que jogava com os tempos, espaços e se esforçava sempre por surpreender. Hoje não, cai-se no mais previsível e banal dos policiais, usando apenas a espiral como marca, e nunca tentando sair para a frente, iniciar um novo ciclo, com novas regras, novos medos. 

domingo, 6 de junho de 2021

Quote - Beethoven (1992)


George: My dream's going down the drain, and you're worried about a dog.

Alice: Your family's going down the drain, and you're worried about a dream.

quinta-feira, 3 de junho de 2021

O diabo veste nada

É, a seguir vem a história de origem da Baronesa, a vilã deste filme, onde descobrimos que afinal na sua juventude era uma jóia de moça e que foi mal tratada pela Condessa, vilã desse filme, que depois também irá ter uma história de origem, com ela nova, a trabalhar no campo, boa pessoa, amiga das cabras e dos cardos, até ver a sua fazenda arder às mãos da Duquesa, vilã desse filme, que depois também irá ter uma prequela, bem já perceberam. Isto em loop até chegar à jovem da idade da pedra, que afinal também era boa e gostava muito dos mamutes. Já chega, foda-se.

terça-feira, 1 de junho de 2021

Os velhos mutantes


Sábado à noite. Quatro amigos de infância, uma grade de minis e um extraterrestre cabra da peste. Quem nunca. Belo serão de vingança este Altered (em português Mutantes) executado pelo camarada Eduardo Sánchez, uma das cabecinhas por detrás de Blair Witch Project. Esta incursão pelo universo dos raptos alienígenas mantém a mesma destreza no que toca a gestão de recursos, poupar no espaço, carregar na expetativa. Segurança máxima ao levantar a cortina do monstro: as mãos, a máscara, o olho e o corpo por inteiro. Arrisco-me mesmo a dizer que está aqui uma das criaturas mais competentes, assustadoras e violentas deste género. Boa surpresa.