No segundo episódio de Philip K. Dick's Electric Dreams, uma senhora em fim de vida contrata uma empresa de turismo espacial para conhecer a antiga Terra. Num futuro bem longe, onde vivemos mais de 300 anos e onde esta bola azul não passa de uma história. Tudo no grande espaço mas tudo construído e confinado na pequena nave. Com três ou quatro atores em cena e a peça resulta. Estas restrições, televisivas e orçamentais, levam ao confinamento e clausura das histórias, obrigando os agentes criativos a procurar novas soluções. Mas em última instância, todas estas circunstâncias resultam numa clara aproximação às personagens, à mensagem.
Blade Runner 2049 espalha-se ao comprido nesta tarefa. Propõe uma história que se quer labiríntica, entre vielas e becos, quartos e salas. É isso que nos apresentam com o incrível início e todos os pressupostos, todas as regras do novo jogo. Até ao jantar. Aquele admirável mundo. Só que depois abre a lente para os grandes planos, para os aéreos e nevoeiros, e a estética passa a mandar. A marcar o ritmo, em detrimento de tudo o resto, dando à luz um enorme vazio. Tudo é bonito, mas tudo é bacoco. Por exemplo, em Valerian, as imagens e delícias daquela estação, estavam povoadas, estavam cheias, viviam. Aqui não. Faltam nomes, faltam interações, tropeções para se poder justificar tamanho empreendimento.
[SPOILERS] E sim, toda esta passadeira vermelha do olho cheio faz com que o argumento coxeie, mas sejamos sinceros, ele já nasceu torto. Os diálogos são pobres, pouco esculpidos e trabalhados. O peso do nome e suas obrigações, acorrenta a ação a um Harrison Ford cansado, a um passado que poderia existir mas que não tinha necessariamente de voltar. A relação entre Gosling e Ana de Armas, as motivações de Jared Leto, são importantes arcos que simplesmente se perdem na maré. E estava aí a força e o centro. Não num suposto híbrido, que é a massa mais batida nesta e noutras andanças: lobisomens que se cruzam com vampiros, o proibido, a salvação. Mas é impossível! Oh meu deus! E há momentos que parecem ter sido escritos num guardanapo depois de um double cheeseburguer, como o momento em que Luv vai à esquadra, tranquila, mata a chefe e depois vai embora. Mas que bófia mais banana é esta? Não está lá ninguém? Aquilo é uma esquadra ou um escritório de advogados? Ninguém prende ninguém? A tempos parece um filme feito por miúdos. A tempos também regressa, quando conhecemos a rebelião, quando percebemos que a memória de um pode ser o sonho de todos, mas fica pouco para agarrar. Pouco para discutir e pensar. E no fundo era só isso que eu queria.
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