sexta-feira, 30 de março de 2018

Venha de lá esse linguadão oh Spielberg


Não é que eu ligue muito a algoritmos ou acasos da vida mas quando abri a página do Spielberg no IMDb, agorinha mesmo, a secção do "conhecido por" tem o A.I. Inteligência Artificial, o Relatório Minoritário, o Encontros Imediatos do 3º Grau e o Parque Jurássico. Lá está. Conhecido, não só por realizar mas por ser. Não os cavalinhos e as pontezinhas dos espiões, não os amistads e as outras estupadas anuais do tio Oscar. O Spielberg é esta vontade de uma fantasia de todos, intemporal e inesquecível, e foi preciso esperar mais de dez anos para ele acordar do hipersono. Ready Player One é assim uma mixórdia falível mas calorosa de abraços, regressos e despertares. Tem do seu lado um CGI tão fluido, e bonito, que se apodera da vista, sem nunca a ferir, sem nunca chocar com as cenas do real, orquestrando magistrais sequências de cá e lá. Edição de mestre, que com a música, fazem da sua duração um menos de nada. Pontuado por aquele charme de um conjunto de desafios, de chaves, para chegar ao final, para ganhar. E essa lógica de jogo, que poderia rapidamente cair em exemplos recentes de cansaço artificial, é conduzida de forma muito orgânica e equilibrada. Contra? Achei que a necessidade constante de referir referências, de dizer olha agora este, e agora aquele, e lembras-te do outro, torna a coisa demasiado enciclopédica. A própria narração tira-nos várias vezes o comando da mão. Falta ar, para respiramos e podermos andar, de quando vez, pelo nosso pé. Deixem-nos também brincar porra. Esta lista de ícones quebra a experiência do próprio OASIS, denuncia em demasia. Libertando-se e acertando a espaços, quando se concentra e escolhe: a cena da segunda chave é prova disso, e amigos, é das sequências mais estupendas que o género já ofereceu no passado recente. Ou no passado de há um porradão de anos talvez. Atrelado ao dicionário dos oitentas e noventas vem uma desnecessária - e cansativa - lição de moral, em formato de telescola, como se tivéssemos todos 5 anos. Olhem, olhem, a realidade é que boa, têm de sair do facebook, e do twitter, e do instagram, e irem comer um gelado à Capri. E depois ver o nascer do sol. A sério? Era necessário? Desde 1995 que a Pixar nos ensina a dizer algo, sem escrever no quadro e sem carimbar testas. Não é assim tão complicado. Mas seja como for, hoje um velho amigo tentou-me contar uma história nova, isso já é feriado em qualquer cinema do mundo.

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