sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009

A infelicidade do Óscar


Sally Hawkins tem na sua Poppy uma das interpretações do ano. Parece fácil construir a leveza da sua personagem, o brilho de uma mulher que no mais escuro dos lugares vê a sua felicidade colorida. Parece básico encarar os dias como contos de fadas e contagiar o envolvente com espirros de alegria. Realmente o sorriso parece ser um instrumento simples, mas não o é e infelizmente não vem com livro de instruções. Porém, Hawkins, de forma singular e genuína, constrói um tipo de pessoa que só conhecemos uma ou duas vezes na vida, que de tão feliz que é franzimos o sobrolho e estranhamos. Excentricidade? Não, é apenas o puro gozo de viver. E não é por ser raro que Happy Go Lucky deixa de ser real, contrapondo a soberba presença feminina com uma não menos genial presença masculina: Eddie Marsan, com o seu azedo instrutor de condução, oferece um daqueles papéis crus e nus, como se personificasse os olhos da tristeza, daqueles que não compreendem um ser assim nos dias que correm. Todas as cenas entre eles os dois são pedaços fantásticos de cinema que devem ser vistos e revistos por toda a gente.

Este par falhou as nomeações aos Óscares. Porquê? Não sei, não é fácil de compreender. Olhando para os nomeados a Melhor Actor Secundário, descartava rapidamente Robert Downey Jr. e a sua excêntrica caricatura, inserindo sem medos Marsan, para lutar de igual para igual com os restantes opositores (embora o Óscar já esteja atribuído a Ledger). Olhando para as senhoras a questão adensa-se. Vamo-nos centrar na categoria de Melhor Actriz Principal e olhar para esta década de nomeações. Num breve passeio, excluindo Bridget Jones e Juno, não há nenhuma personagem verdadeiramente alegre e feliz. Arriscando dizer que 95 por cento destas interpretações envolveram choro e dor, conflitos e amor. Se recuarmos para a década anterior constatamos também que a proporção é de 8 sérias vencedoras contra 2 vencedoras mais risonhas, que ainda assim mostram o seu lado mais perdido (Gwyneth Paltrow em A Paixão de Shakespeare e Helen Hunt em Melhor é Impossível).


Será que a Academia premeia a lágrima em detrimento do sorriso? Será que uma mulher chorosa será sempre mais forte que uma mulher feliz? Pelos vistos e pela história, parece que sim.

1 comentário:

Anónimo disse...

eu acho que o facto de o happy go lucky não ser lá muito bom filme e por isso não ter nomeações outras que chamem a atenção para os desempenhos dos respectivos actores pode estar relacionado com isso.

em relação às duas vencedoras de óscares "felizes" que apontaste, tanto o paixão de shakespeare (que não vi) como o melhor é impossível são incomparavelmente melhores filmes (e muito mais oscarizáveis) do que o happy go lucky.

não obstante (e sem dizer que a sally hawkins não merece a nomeação, longe disso), esta dicotomia das personagens felizes/ tristes é uma boa reflexão a fazer, sim senhor.