segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

O vício de moldar o tempo

Saio de casa e dou de caras comigo. Mais velho e cansado. Este meu eu futuro diz-me que neste preciso dia devo escrever este preciso post, porque ele já o escreveu, porque ele próprio me ou se avisou. Confusos?

Realmente não é fácil entrar num esquema que torce e contorce a massa do tempo que nem padeiro desvairado. Temos de ser flexíveis como os minutos e recuar e avançar os nossos conceitos mais fixos. Para os viajantes no tempo, como eu, qualquer filme que aborde um simples recuo ou um simples avanço tem lugar garantido na sala de cinema ou no leitor cá de casa. Eu até vi a Casa da Lagoa caraças. Sim eu sei, tem o Keanu Reeves e a Sandra Bullock, sim eu sei é mau demais, mas que querem que eu faça? Tenho este problema, este vício do tema.

Esta adoração traz-me porém muitas alegrias e quando pensava que havia já muito pouco para trazer ao género (Donnie Darko foi um pico, pensei que agora o avião iria descer) eis que surgem Los Cronocrímenes e A Mulher do Viajante do Tempo. Muito distintos na história. Muito idênticos na lógica da viagem e na maneira como as coisas se influenciam e conectam. Não posso adiantar muito mais pois cairia rapidamente no campo do spoiler e isso às vezes é chato.


Posso por outro lado dizer que Los Cronocrímenes conta um dia de Hector, homem de família, rapidamente envolvido em estranhos acontecimentos que o levam a uma misteriosa máquina do tempo. Com poucos actores e um orçamento visivelmente reduzido este filme é a prova que se fazem coisas muito boas com a bela da boa ideia. O argumento é muito bom e Nacho Vigalondo constrói de forma exímia a teia narrativa, destapando nas alturas certas as revelações que nos deixam empolgados para a acção seguinte. Com um ritmo frenético, estes crimes do tempo conseguem de surpresa em surpresa ser dos entretenimentos mais eficazes e frescos que vi este ano! Pelo que ouvi dizer Cronenberg quer fazer um remake. Apesar de gostar bastante do trabalho do senhor peço que deixem esta obra de culto como está: pequenina, brilhante e muito eficaz.

Passando para as páginas, dou por fechado o livro A Mulher do Viajante do Tempo, já adaptado para filme e com chegada prevista às salas em 2009. A história relata a relação de Henry, bibliotecário, e Clare, artista plástica, numa aparente existência normal. Olhando de perto descobrimos que Henry sofre de uma doença rara e viaja involuntariamente no tempo, o que torna todo o seu fado um enleio de idas e voltas, um puzzle confuso que só faz verdadeiro sentido na vida de quem o ama. É uma história de amor arrojada, dinâmica, e diferente de tudo o que já foi escrito por essas paredes lamechas. Passar estas páginas para o écran é que me parece realmente uma tarefa complicada, pois Niffenegger brinca com datas e fragmenta por completo a vida dos protagonistas, em migalhas que vamos montando ao longo do tempo, com calma e paciência. Passar isso para filme implica escolher uma linha, cimentar os pedaços e construir um argumento que faça sentido ao espectador. Em duas horas ou menos, e especialmente quem não leu o livro, ter de encaixar aquele estranho arranjo não é um exercício fácil. A escolha dos protagonistas parece-me ser mais que certa (Rachel McAdams, suspiro). Mas certezas só mesmo para o ano.

4 comentários:

C. disse...

Também é um tema que me fascina.

João Gaspar disse...

http://www.youtube.com/watch?v=eLTMSECkNWk


curta do vigalondo. mais ou menos sobre o tema.
e diria que está aqui a génese da ideia do cronocrimenes.

Rogério Ribeiro disse...

Partilho o gosto pelo tema. E que tal o "Primer"? :)

Miguel Ferreira disse...

O Primer vi mas tive dificuldade em percebê-lo...Talvez numa segunda visualização consiga encaixar a lógica!
Beijos e abraços