quarta-feira, 26 de outubro de 2016

Espelho meu, espelho eu

Kelly Macdonald toca na nuvem e diz algo como: o futuro a acontecer e eu a vivê-lo ou o futuro a existir e eu a existir nele ou algo diferente mas neste sentido. Depois revemos, corrigimos; ou abdicamos disso e deixamos o erro, o erro é que tem piada. Black Mirror volta a cair nesse tempo projectado que hoje já temos, num reflexo podre que caminha a passos largos para algo ainda mais escuro. É um jogo de amanhãs, qual deles o mais hoje? O mais nosso? Logo um jogo íntimo, unipessoal, e desenhado no modo de episódios autónomos, para autonomamente podermos escolher. Mas antes dos meus queridinhos, uma nota da rodapé, ou melhor, um avião daqueles das praias: magnífica transição, se é que foi transição, para nova casa e novo número. Há mais espaço, para os mais típicos, para os mais estelares, para os mais experimentais e para os mais novos. Espaço este sempre ocupado por uma identidade muito vincada e pouco aleatória. Todos os géneros no seu género. A posição tem um sentido e agora sim. 


Os meus meninos, que ironicamente coincidem com este arranjo estratégico. Nosedive, o primeiro, primo directo de White Christmas, agarra em seus preconceitos finais e transforma-os num novo sonho americano. Feio, lindo de morrer, com os rosas e seus feitios engomados a darem lugar a uma catarse maravilhosa, naquela que é possivelmente a cena final mais emblemática - Edward Norton naquela última noite - da série. É a introdução perfeita, para leigos, para fãs, para o mundo. Saltamos logo para o último, o mais comprido da saga, que podia muito bem ser o melhor filme policial do ano. Possivelmente é. Num retorcido julgamento ambientalista que termina com a punição inevitável, é o apocalipse, é o final. Desde a música, até às incríveis interpretações da dupla feminina, este ódio à nação é amor para a vida.


Por último, o meu predilecto, continuando no feminino. San Junipero, a réstia de luz que sobra no poço. Um regresso ao passado para encontrar alguma réstia, do que somos e do que queremos ser. Nada se limita, tudo se vai expandindo, lutando até à felicidade, essa eternidade prometida, seja em que "cidade" for. É uma canção, um suspiro de amor, um magnífico acreditar. Obrigado pela viagem. Black Mirror regressa como sempre foi, uma montanha russa, altos e baixos de episódios onde nada é garantido, onde nos perguntamos a cada curva. É a descoberta, do que nos contam e do que queremos depois contar, no nosso espelho negro.

Por último, e porque este desabafo não seria o mesmo sem um top maricolas, aqui ficam os meus episódios até à data, do pior para o melhor, com referência ainda mais bicharoca aos episódios desta temporada:
13. The Waldo Moment (S2, Ep3)
12. The National Anthem (S1, Ep1)
11. Men Against Fire (S3, Ep5)
10. Playtest (S3, Ep2)
9. Be Right Back (S2, Ep1)
8. Shut Up and Dance (S3, Ep3)
7. Fifteen Million Merits (S1, Ep2)
6. White Bear (S2, Ep2)
5. White Christmas (S2, Ep4)
4. Nosedive (S3, Ep1)
3. Hated in the Nation (S3, Ep6)
2. San Junipero (S3, Ep4)
1. The Entire History of You (S1, Ep3)

terça-feira, 25 de outubro de 2016

Fiquem pelo Castiço

Em A Lenda do Cavalo Castiço, o maior western grandolense, quiçá de todo o Alentejo, de sempre, parafraseia-se por diversas vezes "vai ser tiranzada de meia-noite". Ora bem, se há uma expressão que descreve estes novos 7 embustíssimos é essa mesma. O filme do Fuqua não passa de tiranzada de meia-noite, do início ao fim, com um conjunto de bonecos frouxos, mal amanhados, sombras das suas próprias personagens passadas, como se no intervalo de outra coisa esta coisa tivesse nascido. É mau, é triste, já passou.

Nas nalgas, a todo o vapor

Lembrar que continua ativo o passatempo mais incrível do ano e deixar aqui a última revisão da matéria dada, com um filme que nos disse muito. Tanto que ficámos sem palavras, porém sentidos, em especial por um início que é uma ode às nalgas, naquela altura em que elas funcionavam a vapor.

Análise à estreia da sétima temporada de The Walking Dead, frame a frame

Acredito que, num universo paralelo, em que eu seja meio costa riquenho e possua um escorpião como animal de estimação, num aquário, pudesse francamente escrever uma crónica destas. Com ânimo, sinónimo de que há sete anos levava com este walking todo, and walking, and more walking. Mas não, saltei bem lá atrás, e o que vos queria dizer, depois de coscuvilhar este "enorme" cliffhanger e seu resultado é: por amor de deus malta, tanta coisinha boa, ou tanta coisinha mais ou menos, e vocês continuam a mamar com uma série que vos faz esperar um ano, para matar um borra botas que não interessa a ninguém e o gajo que falece na BD. A sério couves de bruxelas que escrevem estes argumentos? E cola, o desespero é que cola, e que agora os caminheiros vão levar com mais quinze passeios bacocos, de rebentar a sola dos pés. Sem personagens, sem história, sem fim à vista.

quinta-feira, 20 de outubro de 2016

Este frame já é um marco

As chamadas desgarradas para óscar, onde se tem de chorar, gritar, baba e muito ranho. A probabilidade de nomeação é diretamente proporcional à quantidade de muco, sempre. A academia adora a soberba desnecessária, a explosão simulada como carimbo de qualidade, de realidade. Captain Fantastic é o oposto, aquele discreto suspiro, em contenção, que eu tanto adoro. Um bonito poema que se respeita e nos respeita, sem tiques de indústria ou não indústria. É a família, e suas canções, suas crenças na viagem, suas dúvidas que ficam nossas. Por último, Viggo Mortensen, sem êxtase nem artifícios, seco e dorido, a chorar sozinho, sem ninguém ver. Mirones de um dos últimos grandes talentos perdidos e esquecidos, como se mesmo em casa nunca tivéssemos saído da floresta. Delicioso.

terça-feira, 18 de outubro de 2016

O tostão do chavão

Don´t Breathe é como a pescada, antes de o ser já o era. Produto de uma genial máquina promocional que fez o básico, o bê-á-bá, oferecer a forma antes do conteúdo. O poster era rei na manobra: "dos criadores de Evil Dead", "das mentes distorcidas por detrás de Evil Dead", "o novo filme de Fede Alvarez", "o melhor filme americano dos últimos 20 anos". Para os leigos alvo deste terror pipoqueiro, não só Evil Dead é um filme de 2013, como Fede Alvarez é alguém com nome e experiência na área, no género, alguém que interessa. Foda-se não, só tem um filme, que é esse Evil Dead, que é horrivelzinho. Publicitar isso não deveria resultar. Mas resultou. E não, não é o melhor de anos alguns. Consegue exercitar algumas cenas com mestria, algumas apneias do seu título, mas fora isso é um thriller banal, sem ideias e sem surpresas. Ideal para quem não vê mais nada. Porque pondo os pontos nos is, The Neighbor faz exatamente a mesma narrativa de invasão e consegue ser mais em tudo: tensão, violência, interpretações. E o realizador tem ao menos uma bela mitologia no seu currículo. Ou Hush, do Mike Flanagan, que brinca aos sentidos de forma clássica mas genial. Onde está o hype para estes dois? Onde estão os chavões da forma? Vão mas é feder para outro lado!

De mansinho, Abigail Spencer e seus muchachos

Timeless faz aquilo que a maior parte dos revivalismos não consegue, reinventa. Transforma, agita de tal forma - Sliders, Quantum Leap, Timecop - que quando paramos a saudade já não ofende, mas sim surpreende e catalisa. Utiliza, como a sua premissa, a própria história para dela tirar novos futuros. Assim ligeirinha, rápida, bem interpretada e de boa mitologia. E pronto, viagens no tempo meninos e meninas. Até ver, o Sci-Fi do ano!

sábado, 15 de outubro de 2016

Griswolds Forever

Nunca deveria ter duvidado dos Griswolds. Tenho vergonha. Sinto-me imundo por tê-los deixado na prateleira, por ter equiparado o universo National Lampoon's Vacation a qualquer borra remakes da piça, com o bacoquismo dos novos parâmetros. Das novas métricas e tesouradas. Vacation é o que é, uma comédia episódica parvalhona e trapalhona, cheia de altos e baixos, mas carregada de gargalhadas. A pedir para ver outra e outra vez, com este e com aquele, porque a parte da Mariah Carey é genial, ou a porrada ao som de Sleigh Bells, o puto do saco, o puto do saco é o maior, e o gajo da ratazana, o gajo da ratazana merece um spinoff. Este respeito pelo desvario dos 80, pela capacidade de eternizar as piadas, de lhes dar espaço, dando simultaneamente um ar de família, faz desta sequela reboot a melhor dos últimos largos e largos anos. E agora vocês: there used to be a greying tower alone on the sea...